sexta-feira, 29 de junho de 2012

METÁFORA



'A arte existe, porque a vida não basta!' Ferreira Gullar





METÁFORA



Não sei nada e vivo a buscar tanto,
E só me resta a certeza da morte.
Falo, vivo arremessando palavras ao vácuo,
E não digo nada que me cicatrize os cortes.
Cortes profundos de tombos de quem nada sabe.
E o tempo que passa impiedoso, indiferente,
Pergunta-me a cada instante:
Pra quê correr se não se tem chegada?
E a minha estada, tão breve, a que se deve?
Pra quê este viver se embebedando de preocupações,
Se as soluções virão, ou não, independente de minha vontade.
E lá se vai mais um dia, mais um pôr de sol,
E lá se vai mais uma rotação, e aqui estou no mesmo lugar.
Pra quê tanta pressa se não saio do lugar,
Se os astros, que flutuam, me prendem,
Se minha vida se resume em sempre voltar.
Meu alívio vem da poesia,
Só me resta a poesia,
Que me leva pelo universo das emoções.
Só me resta a rima,
Escrita, cantada, gritada,
Mesmo gemida em forma de despedida,
Resta-me uma leve e breve metáfora,
Para que o viver não seja apenas esperar a morte.

Marcelo Faleiros

sexta-feira, 22 de junho de 2012

A CIDADE

"Cidade grande, grande solidão." 
  Estrabão




A CIDADE

A cidade vai à busca do caos,
Ali estático, para-se, olha-se, chora-se.
Abafada derrete ao sol,
Sons, gritos aflitos, aglomeram-se.
Tanto cresce, perde-se,
Calados, passos, passados, solidão.

A cidade engole pelas bordas,
Traga-se árvores, aspira-se sonhos.
Explode por dentro,
Arremessa-se lixo, cria-se feridas.
Perde o rumo, sem mão,
Todos os caminhos, só contra mão.

A cidade tem veias, sem oxigênio,
Só o venoso, sem pulmão, só agonia.
Mata-se, na tarde, no rush,
Todos atolados na pressa, na pressão.
Atropela-se, apela-se, pela-se,
Mais um corpo, no vão, menos um.

A cidade suplica a própria morte,
Fim da insuportável eternidade.
A cidade irá sublimar na ambição,
Esvaziar para sempre, ficando o esqueleto.
Ficando o vento a lixar as arestas,
Ficando apenas a mancha na bela Terra.

Marcelo Faleiros

LUTO


"Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio.Que a morte de tudo que acredito não me tape os ouvidos e a boca."Oswaldo Montenegro

LUTO


O luto se faz necessário.
O silêncio em meio à lágrima é essencial.
A quietude com a amplitude do fim,
Leva-nos para reflexões fundamentais.
As tantas velas queimam vaidades,
Acendem algumas verdades, acorda-nos.
Flores coroam o sublime momento,
Emolduram, resta-nos viver, continuar.

O luto deve ser bem vindo.
Pois a morte nos liberta da eternidade,
Fazendo com que a vida tenha mais sentido.
É no fim que percebemos o que temos.
É na saudade que resgatamos o já vivido.
E as tantas vaidades escoam,
Indo por ralos, deixando-nos humanos.

O luto não é fácil nem feliz.
O tempo se faz lento, sem alento.
Chora-se, implora-se a volta, em vão.
Percebe-se o que antes tanto se tinha,
E vê-se o que ainda se tem,
E se implora a Deus mais tempo
Para se perdoar pelo o que não se disse.

O luto é o que teremos um dia.
Quando o ar não mais alimentar.
Quando o olhar se permitir outra dimensão,
Quando o que ficou não é mais carne.
Quando o que se tem, ficar com os que ficam.
E se fincar no coração o fim do pulsar.
Quando, enfim, nosso corpo frio,
Ficar estático, amado, sendo velado.

Marcelo Faleiros

sexta-feira, 1 de junho de 2012

O QUE POSSO LHE DAR?


"O amor é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar." Carlos Drummond de Andrade










O QUE POSSO LHE DAR?

O que posso lhe dar que valha a pena?

As penas de um amor sofrido em silêncio,
A possibilidade de uma saudade sentida,
A lágrima escorrida a se ouvir alguma música.

O meu olhar marejado de muito amor,
A fala ao pé do ouvido em um por de sol,
O silêncio tão necessário a se olhar o mar.

A mão dada como criança insegura,
Uma rosa catada em um canteiro da vida,
Um sorriso tímido ao te admirar sob a lua.

O que posso lhe dar que valha a pena?

Um grito de paixão louca em sua janela,
O calor ao lado da fogueira na noite de inverno,
Um apelo de perdão por minha carência.

Uma declaração em rimas com flores vermelhas,
Uma caminhada em chuvas de verão e arco íris,
Um amor eterno que já me domina há tempos.

Os tantos batimentos desordenados de meu coração
Ou todo meu coração tão oxigenado por sua doce voz.
A frágil proteção de quem só tem a própria vida,
Minha vida tão frágil sem a sua presença.

O que posso lhe dar que já não seja seu?

            Marcelo Faleiros


PALHAÇO


"Eu gostaria de saber passar por esse circo dando gargalhadas o tempo todo, mas às vezes, meu palhaço é triste." Alessandra Espínola.









PALHAÇO

O riso do palhaço hidrata jovens corações
E no camarim se vê, pelo reflexo de pedaço de espelho,
Se vê pela maquiagem borrada da lágrima em solidão,
O quanto o sonho do circo já se escoa.

Será que o sonho do palhaço já se perdeu,
Ou será, que apenas ele vê a verdade da vida.
E com o seu sorriso triste a tropeçar pelo ar
Liberta-se das hipocrisias tão sérias que nos cerca.

Vai palhaço a correr com seu terno multicor
Girando pelo picadeiro atrás de um terno olhar.
E por trás da cortina, apenas a simples esperança.
Que desde criança cambaleia em cordas bambas.

Diga, querido palhaço, o quanto dói o tapa de mentira,
Diga o quando a mesma piada ficou triste,
Vai, em cambalhotas, vendo que a graça já se foi,
Vai pelo vão da cortina, vendo o tempo escoar.
E pelo canto de seu lindo olhar
Ainda resta um último sorriso de criança.

                     Marcelo Faleiros.